quarta-feira, 5 de abril de 2017

55- GOVERNANDO PELAS REDES SOCIAIS.

Olha aí o Doria surfando nas redes. Fazendo o que todo político devia aprender a fazer: usando a comunicação o tempo todo, mesmo depois de eleito. Mais ainda depois de eleito. Mas usando comunicação da forma correta.

Os eleitores cansaram. Na época das eleições os políticos aparecem, vêm para a rua, estão nas redes sociais, nos programas eleitorais. Simpáticos, abraçando e beijando todo mundo. Depois que conseguem os votos, somem. Ficam fechados em seus gabinetes, ninguém mais consegue falar com eles.

Essa é a velha forma de fazer política, que a maioria de nossos políticos arrogantes continua usando. E é por isso que as pessoas vão para a rua gritar: vocês não nos representam. Representam apenas seus próprios interesses, como a Lava Jato está provando.

Façamos justiça, esse não é apenas um fenômeno brasileiro. A separação entre a classe política e o povo que devia representar é um fenômeno mundial. A democracia, da forma que praticamos hoje, está em crise. Manifestações, em quase todos os países, estão levando essa mensagem para todo mundo ouvir.

E isso acontece numa época em que nunca foi tão fácil se comunicar, ficar perto das pessoas. Com as novas tecnologias, qualquer um pode conversar com quem quiser, com o país inteiro -sem precisar de muito dinheiro. Basta querer. Basta ter vontade de aprender. Basta ter humildade para também saber ouvir os outros.


 As novas tecnologias já mudaram a forma como consumimos música, como lemos revistas, jornais e livros, como nos relacionamos com nossos amigos, como trabalhamos com nossos bancos, como fazemos compras, etc. Porque também não iam mudar a forma como fazemos política?

É nas redes sociais que agora a política acontece. É onde as pessoas se encontram diariamente, discutem, trocam opiniões, defendem suas ideias, formam grupos, marcam manifestações. E, infelizmente, onde vivem brigando com quem tem ideias diferentes.
Todo bom profissional de comunicação sabe que tudo é comunicação. A forma como um político se comporta, se veste, fala com as pessoas, quem são seus amigos, as obras que ele faz e como faz, os secretários que escolhe, tudo passa uma mensagem. Quem não tem consciência disso está, todo dia, passando mensagens que não gostaria ou não deveria. Se está governando, está comunicando alguma coisa. Mesmo que fique calado.

Todo bom profissional também sabe que a coisa mais importante que a comunicação pode fazer pelo seu cliente é construir uma imagem forte e diferenciada. Como está fazendo o Doria. Na eleição, além de ser uma cara nova, apostou na imagem de Gestor e não político. Trabalhador. Inovador. Anti-PT. Veja o resultado: um quase desconhecido da grande população foi eleito no primeiro turno, na maior cidade do país.

No dia em que tomou posse, reiniciou esse trabalho imediatamente.  E foi mais fundo. Transformou seu governo num verdadeiro reality show. É o governo Doria, ao vivo, para todo mundo acompanhar. Todo dia você vê onde ele está, o que está fazendo e depois ele ainda
aparece prestando contas. E as pessoas participam, batendo palmas,
elogiando, criticando. Tudo isso repercutindo nas rádios, TVs e nos jornais, onde o Doria virou pauta diária.

E lá vai ele reafirmando e comprovando os valores que prometeu na campanha. Trabalhador -está nas ruas e na internet das cinco horas da manhã até tarde da noite. Inovador -a ideia de comprar tempo ocioso das máquinas de exames de grandes hospitais, por preço SUS, por exemplo, é muito boa, não é? Anti-PT -ataca o Lula sempre que pode. Gestor -chama atenção para isso todas as vezes que fala: não é milagre não, gente, é boa Gestão.

Ainda trabalha junto outros valores que as redes sociais adoram: Transparência, Participação, Proximidade das pessoas. Resultado? Em alguns meses saiu do quase anonimato para ser visto como futuro candidato a Presidente da República. Agora está incomodando os políticos tradicionais.

Tá todo mundo de olho no case Doria. Até quando vai dar certo? A realidade de uma cidade que tem muitos gastos e pouca verba para realizar ainda vai encontrar com ele ali na esquina. Mas parece que Doria e sua equipe (que cria junto todas essas coisas para ele) estão se mostrando inteligentes o suficiente para arrumar uma forma de contornar as dificuldades.

O importante é que ele acredita no bom uso da comunicação, coisa que a maioria dos políticos nem consegue entender. Sabe o que é construir uma imagem. É bom de palco para passar as suas mensagens. Hoje tem a aprovação de 70% dos paulistanos. E de muito mais gente por todo o Brasil.

Mas daí a virar candidato a presidente é outra estória, não depende só dele, mas de muitas outras coisas. E se ele chegar lá, vai ter que acrescentar outros valores ao seu discurso. Não basta ser bom gestor para governar o Brasil.

Política sempre foi comunicação. Desde a época dos grandes comícios, dos 3 ou 4 partidos e dos grandes oradores. Levavam vantagem os políticos que tinham carisma, sabiam comunicar melhor suas ideias, que juntavam o povo na praça e conseguiam inflamar as pessoas. Um grande discurso ficava sendo lembrado e repetido por muito tempo.

Hoje vivemos o timing da internet. Um novo discurso, rápido, objetivo, todo dia. Repercussão imediata, tanto na rede como nas rádios, TVs e jornais do dia seguinte. Política, mais do que nunca, é comunicação. Como dizia o velho Chacrinha, quem não se comunica se trumbica.


quarta-feira, 22 de março de 2017

54- CARNE FRACA: NO FIM, IMAGEM É TUDO.

Se o Brasil é o maior exportador de carne do mundo, devia ter o melhor controle de qualidade do mundo, nas empresas, e o melhor controle de inspeção do mundo, nos governos federais, estaduais, municipais. Porque imagem é tudo. E 20 anos construindo uma imagem podem despencar por causa de uma burrada, como está acontecendo. Adeus confiança, adeus mercados.

São as grandes empresas da área quem, em primeiro lugar, deviam cuidar da moralidade da classe. Defender sistemas de controle internos fortes, como regra para todo o negócio. Elas são as maiores interessadas na boa imagem da carne do Brasil. Lucram com isso, vivem disso.

Elas têm que ter consciência de que, no fundo, não vendem carne. Vendem confiança. E que apenas um frigorífico não agindo segundo as regras da boa higiene pode derrubar a confiança em todo o negócio. Como está acontecendo.

E o governo também devia colaborar, já que o setor representa parcela grande do PIB, empregos, impostos, etc. Fazendo um inspeção técnica e séria.

Simples assim. Mas parece que ninguém fez a lição de casa.



Veja o caso das empreiteiras. A Odebrecht era considerada uma empresa com governança moderna, modelo para todas as outras. Quem lia os valores, que a Odebrecht estampava como cartão de visitas da empresa, ficava maravilhado. Mas parece que as pessoas que tocaram a Odebrecht não deram importância para aquelas palavras bonitas que alguém escreveu. A Odebrecht, sendo a maior, ditou as regras do mercado. E deu no que deu.

Dois anos atrás fiz o curso de formação de conselheiros do IBGC –Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Vamos aprender alguma coisa nova, eu que não me dou bem com os números e com a burocracia administrativa. Era um curso sério, aprendi muita coisa.

Para todos entenderem, toda grande empresa com ações na bolsa precisa ter um Conselho, formado por gente de fora, que é quem realmente comanda a empresa, representando os acionistas. Escolhe a diretoria, aprova o plano estratégico, aprova os balanços, e por aí vai. Também têm responsabilidade sobre tudo o que acontece na empresa. Podem até pegar cadeia.

A única coisa que estranhei no curso é que os Conselhos sempre são formados por gente que entende de finanças, entende de leis, entende de administração. Em todos que pesquisei, não tem gente que entende de comunicação.

Então questionei: já que no fim das contas, o que vale mais em uma empresa são os chamados ativos intangíveis (como o valor da marca, o prestígio no mercado, etc), porque os Conselhos não têm um especialista nesta área? Vocês não acham importante comunicação participar do pensamento, do planejamento estratégico das empresas? Não ouvi nenhuma resposta satisfatória dos especialistas do curso.

E olha que o IBGC é uma entidade séria, que tem como objetivo estimular a governança moderna, ética e transparente por todo o Brasil. Fazem um bom trabalho, gente de todos os estados frequentam os cursos deles.

Moral da história: já que a carne é fraca, infelizmente parece que a cultura da corrupção está espalhada por várias categorias de negócios. A simbiose entre governo e empresas privadas é muito maior do que a gente imaginava.

E segundo, parece que nossa cultura corporativa não leva tão a sério a importância da construção de marca, de prestígio das empresas. Que, se bem trabalhados, podem virar os maiores valores de uma empresa. Tanto que especialistas da área não estão presentes nas áreas de decisão verdadeiras. Ficam lá embaixo, na Diretoria executiva, aprovando as campanhas de comunicação do dia a dia.

Ninguém, então, tem consciência e autoridade para perguntar: não é melhor perder 500 Kg de carne vencida do que colocar em risco todo o nosso negócio?