quinta-feira, 2 de abril de 2015

52- NÃO EXISTE DEMOCRACIA DE VERDADE SEM COMUNICAÇÃO.

Na pré-história da democracia, se praticava a democracia direta: o povo se reunia numa praça e todos participavam diretamente das decisões. Depois as cidades e os países cresceram e surgiu a figura do político, que representava as pessoas nas decisões.

Nosso político da pré-história devia se reunir com seus eleitores numa praça e dizer a que veio. E este primeiro comício da história durou bastante tempo, como forma de comunicação de políticos com a sociedade. Me lembro, ainda, dos grande comícios que aconteceram no Brasil. Estudante, fui até São Bernardo ouvir um tal de Lula falar. Fui ao Comício das Diretas Já, no Anhangabaú.

Aí veio o rádio, a TV, a internet. E o evento político foi se transformando, cada vez  mais, num evento de comunicação. Gente falando a distância, usando a tecnologia da época. Num país com mais de 200 milhões de habitantes, com cidades com mais de 1 milhão, ninguém consegue mais falar direto com as pessoas. Então, dá-lhe comunicação.

A política foi aprendendo as regras das tecnologias que assumiu: nada mais daqueles discursos empolados com palavras difíceis, que impressionavam as pessoas nos comícios ao vivo. O negócio agora é falar simples, direto, conversar com as pessoas. As técnicas dos comerciais de propaganda pegaram, procurando impactar as pessoas. As campanhas políticas, com seus horários gratuitos de TV, viraram eventos nacionais de comunicação.

Nada contra. É assim mesmo que as coisas evoluem. A linguagem, os efeitos, o timing da TV, da propaganda, do cinema, as pesquisas de opinião, são as ferramentas de hoje das campanhas eleitorais, da comunicação política. E essas técnicas ainda vão evoluir bastante, por causa das novas tecnologias.

Mas o nosso político lá da pré-história da democracia também encontrava seus eleitores toda hora, numa cidade pequena. Devia se reunir com eles para prestar contas, dizer o que estava fazendo em nome deles, discutir com eles que posição tomaria em assuntos mais complicados. O nosso político de hoje não faz mais isso. Só usa a comunicação para falar e ser ouvido pelos eleitores. Para ganhar a eleição.

Nossos políticos continuam na era da comunicação de mão única, como nossa velha TV aberta e nossos jornais de papel. Eles falam e a gente ouve. Que negócio é esse de ouvir as pessoas? Continuam fazendo comunicação pela metade, praticando democracia pela metade. Daí a quantidade de gente nas ruas, dizendo que essas pessoas não me representam, esses partidos não me representam. Ninguém ouve mais ninguém.



O que os políticos precisam aprender é que democracia é diálogo, interação, participação. Por isso comunicação é o combustível da democracia. Deve acontecer o tempo todo, e não só naqueles poucos meses da campanha eleitoral. E deve ter duas mãos – falar e ouvir bastante seus eleitores.

Mais ainda, devem aprender que tudo é comunicação: a forma como eles governam, os projetos que eles executam, etc., etc. Tudo passa uma mensagem, queiramos ou não. Quando não temos consciência disso, lá está aquele político prometendo uma coisa e agindo de forma diferente. Passando uma imagem cada vez mais confusa para seus eleitores.

O verdadeiro papel da comunicação é dar coerência a tudo isso. Fazer com que tudo tenha o mesmo foco, caminhe na mesma direção. Criar uma estratégia de longo prazo para trabalhar a imagem de um político, do mesmo jeito que se trabalha a imagem de uma empresa ou um produto. É assim que funciona. Não adianta chamar um marqueteiro a poucos meses da eleição para consertar uma imagem que já foi comprometida. Comunicação não faz milagres.

O  pior que pode acontecer é as pessoas se desencantarem de vez com os políticos que não me representam e pedirem a volta para a democracia direta: não tem mais políticos intermediários, o governo fala direto com as pessoas via internet, nossa grande praça de hoje, que decidem, elas mesmas, o que se deve ou não deve fazer.


(Publicado também em www.marqueteiros.com.br)