Se o Brasil
é o maior exportador de carne do mundo, devia ter o melhor controle de
qualidade do mundo, nas empresas, e o melhor controle de inspeção do mundo, nos
governos federais, estaduais, municipais. Porque imagem é tudo. E 20 anos
construindo uma imagem podem despencar por causa de uma burrada, como está
acontecendo. Adeus confiança, adeus mercados.
São as
grandes empresas da área quem, em primeiro lugar, deviam cuidar da moralidade
da classe. Defender sistemas de controle internos fortes, como regra para todo
o negócio. Elas são as maiores interessadas na boa imagem da carne do Brasil.
Lucram com isso, vivem disso.
Elas têm que
ter consciência de que, no fundo, não vendem carne. Vendem confiança. E que
apenas um frigorífico não agindo segundo as regras da boa higiene pode derrubar
a confiança em todo o negócio. Como está acontecendo.
E o governo também
devia colaborar, já que o setor representa parcela grande do PIB, empregos,
impostos, etc. Fazendo um inspeção técnica e séria.
Simples
assim. Mas parece que ninguém fez a lição de casa.
Veja o caso
das empreiteiras. A Odebrecht era considerada uma empresa com governança moderna,
modelo para todas as outras. Quem lia os valores, que a Odebrecht estampava
como cartão de visitas da empresa, ficava maravilhado. Mas parece que as
pessoas que tocaram a Odebrecht não deram importância para aquelas palavras
bonitas que alguém escreveu. A Odebrecht, sendo a maior, ditou as regras do
mercado. E deu no que deu.
Dois anos
atrás fiz o curso de formação de conselheiros do IBGC –Instituto Brasileiro de
Governança Corporativa. Vamos aprender alguma coisa nova, eu que não me dou bem
com os números e com a burocracia administrativa. Era um curso sério, aprendi
muita coisa.
Para todos
entenderem, toda grande empresa com ações na bolsa precisa ter um Conselho,
formado por gente de fora, que é quem realmente comanda a empresa,
representando os acionistas. Escolhe a diretoria, aprova o plano estratégico,
aprova os balanços, e por aí vai. Também têm responsabilidade sobre tudo o que
acontece na empresa. Podem até pegar cadeia.
A única
coisa que estranhei no curso é que os Conselhos sempre são formados por gente
que entende de finanças, entende de leis, entende de administração. Em todos
que pesquisei, não tem gente que entende de comunicação.
Então
questionei: já que no fim das contas, o que vale mais em uma empresa são os
chamados ativos intangíveis (como o valor da marca, o prestígio no mercado,
etc), porque os Conselhos não têm um especialista nesta área? Vocês não acham
importante comunicação participar do pensamento, do planejamento estratégico
das empresas? Não ouvi nenhuma resposta satisfatória dos especialistas do
curso.
E olha que o
IBGC é uma entidade séria, que tem como objetivo estimular a governança
moderna, ética e transparente por todo o Brasil. Fazem um bom trabalho, gente
de todos os estados frequentam os cursos deles.
Moral da
história: já que a carne é fraca, infelizmente parece que a cultura da
corrupção está espalhada por várias categorias de negócios. A simbiose entre
governo e empresas privadas é muito maior do que a gente imaginava.
E segundo,
parece que nossa cultura corporativa não leva tão a sério a importância da
construção de marca, de prestígio das empresas. Que, se bem trabalhados, podem virar
os maiores valores de uma empresa. Tanto que especialistas da área não estão
presentes nas áreas de decisão verdadeiras. Ficam lá embaixo, na Diretoria
executiva, aprovando as campanhas de comunicação do dia a dia.
Ninguém,
então, tem consciência e autoridade para perguntar: não é melhor perder 500 Kg
de carne vencida do que colocar em risco todo o nosso negócio?