quarta-feira, 22 de março de 2017

54- CARNE FRACA: NO FIM, IMAGEM É TUDO.

Se o Brasil é o maior exportador de carne do mundo, devia ter o melhor controle de qualidade do mundo, nas empresas, e o melhor controle de inspeção do mundo, nos governos federais, estaduais, municipais. Porque imagem é tudo. E 20 anos construindo uma imagem podem despencar por causa de uma burrada, como está acontecendo. Adeus confiança, adeus mercados.

São as grandes empresas da área quem, em primeiro lugar, deviam cuidar da moralidade da classe. Defender sistemas de controle internos fortes, como regra para todo o negócio. Elas são as maiores interessadas na boa imagem da carne do Brasil. Lucram com isso, vivem disso.

Elas têm que ter consciência de que, no fundo, não vendem carne. Vendem confiança. E que apenas um frigorífico não agindo segundo as regras da boa higiene pode derrubar a confiança em todo o negócio. Como está acontecendo.

E o governo também devia colaborar, já que o setor representa parcela grande do PIB, empregos, impostos, etc. Fazendo um inspeção técnica e séria.

Simples assim. Mas parece que ninguém fez a lição de casa.



Veja o caso das empreiteiras. A Odebrecht era considerada uma empresa com governança moderna, modelo para todas as outras. Quem lia os valores, que a Odebrecht estampava como cartão de visitas da empresa, ficava maravilhado. Mas parece que as pessoas que tocaram a Odebrecht não deram importância para aquelas palavras bonitas que alguém escreveu. A Odebrecht, sendo a maior, ditou as regras do mercado. E deu no que deu.

Dois anos atrás fiz o curso de formação de conselheiros do IBGC –Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Vamos aprender alguma coisa nova, eu que não me dou bem com os números e com a burocracia administrativa. Era um curso sério, aprendi muita coisa.

Para todos entenderem, toda grande empresa com ações na bolsa precisa ter um Conselho, formado por gente de fora, que é quem realmente comanda a empresa, representando os acionistas. Escolhe a diretoria, aprova o plano estratégico, aprova os balanços, e por aí vai. Também têm responsabilidade sobre tudo o que acontece na empresa. Podem até pegar cadeia.

A única coisa que estranhei no curso é que os Conselhos sempre são formados por gente que entende de finanças, entende de leis, entende de administração. Em todos que pesquisei, não tem gente que entende de comunicação.

Então questionei: já que no fim das contas, o que vale mais em uma empresa são os chamados ativos intangíveis (como o valor da marca, o prestígio no mercado, etc), porque os Conselhos não têm um especialista nesta área? Vocês não acham importante comunicação participar do pensamento, do planejamento estratégico das empresas? Não ouvi nenhuma resposta satisfatória dos especialistas do curso.

E olha que o IBGC é uma entidade séria, que tem como objetivo estimular a governança moderna, ética e transparente por todo o Brasil. Fazem um bom trabalho, gente de todos os estados frequentam os cursos deles.

Moral da história: já que a carne é fraca, infelizmente parece que a cultura da corrupção está espalhada por várias categorias de negócios. A simbiose entre governo e empresas privadas é muito maior do que a gente imaginava.

E segundo, parece que nossa cultura corporativa não leva tão a sério a importância da construção de marca, de prestígio das empresas. Que, se bem trabalhados, podem virar os maiores valores de uma empresa. Tanto que especialistas da área não estão presentes nas áreas de decisão verdadeiras. Ficam lá embaixo, na Diretoria executiva, aprovando as campanhas de comunicação do dia a dia.

Ninguém, então, tem consciência e autoridade para perguntar: não é melhor perder 500 Kg de carne vencida do que colocar em risco todo o nosso negócio?